05 abril 2007

O cotidiano de uma "ghost writer" acadêmica

A seção "diário" da revista Piauí de abril de 2007 é absolutamente imperdível! Redigido por Maria Lopes, "paulistana formada em taquigrafia", o texto narra o cotidiano de uma ghost writer acadêmica. Ou seja, o dia-a-dia de alguém que se diz "leiga em tudo", mas capaz de escrever ou revisar textos acadêmicos sobre assuntos tão díspares quanto "As características do profissional de marketing do século XXI", "Crime, prisão e penas" ou a viabilidade e lucratividade do comércio de sanduíche de tofu e suco de hortelã em frente aos estádios de futebol! É absolutamente genial! A lógica da cobrança é uma "pérola" de democratização da educação: o preço deve ser menor para cliente que trabalha fora, estuda à noite e tem família; e se, além disso, é mãe e tem dupla jornada, o preço é ainda um pouco mais baixo! Mas, se for alguém que não trabalha, que é jovem, solteiro e estuda na PUC, Mackenzie, Santa Marcelina ou alguma faculdade bizarramente cara, o preço dobra! Como esclarece Maria Lopes, seu lema é "tirar dos ricos para dar aos pobres"! Cada trabalho custa entre R$ 150,00 e R$ 600,00. E tudo é negociado por seu "gerente de negócios", já que ela mesmo diz não ter "tino empresarial"! A intermediação, além de garantir um distanciamento dos "clientes", permite-lhe aproveitar um "negócio que vai de vento em popa". Diz ela: "Uniban, Unip, Uninove e outras similares, um dia, vão é me pedir participação nos lucros, pelo volume de trabalho que me propiciam. No Brasil de hoje, meu trabalho de monografias por encomenda deve ser o mais promissor de todos"! Além de ser muito bem redigido, o texto tem, aos olhares de quem vive o cotidiano acadêmico, uma qualidade impagável: ele traz um olhar inédito para o debate sobre a autenticidade dos trabalhos acadêmicos. Nesses debates, o monopólio da fala explícita está, essencialmente, com os professores. Há, ainda, uma fala oculta, envergonhada, por parte dos "clientes". Mas, os redatores, os ghost writers, jamais são ouvidos. Quem são eles? Qual é a sua formação? Como eles se sentem? Tudo isso desaparece sob a ausência de interlocução. Afinal, eles são pagos para serem "anônimos". Enfim, belíssima reportagem; mais uma bola dentro para a revista Piauí!

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